CCXP 2016 – SESI SP Editora trouxe novidades da literatura fantástica brasileira e batemos um papo com as autoras

Além do selo de HQs, O Manto Escarlate e Alek Ciaran e os guardiões da escuridão foram as apostas da SESI-SP Editora

O estande da SESI SP Editora fez seu nome durante a Comic Con Experience 2016 que trouxe duas escritoras brasileiras de literatura fantástica para o evento, Flávia Muniz e Shirley Souza, respectivamente com suas obras O Manto Escarlate e Alek Ciaran e Os Guardiões da Escuridão. Os dois novos títulos serviram de cenário para uma experiência imersiva que aconteceu dentro do estande da editora na feira, com o uso de um óculos de realidade virtual, o visitante entrava nos universos fantásticos das duas histórias., podendo observar o mundo a sua volta e os sons, já dando um gostinho do que esperar dos livros.

Conversamos com ambas as autoras que também participaram de um dos Painéis do evento. Elas nos contaram um pouco sobre o livro de cada uma e como foi o processo de criação deles, recebemos alguns spoilers das obras, mas para o bem de todos, nada será revelado.

Flávia Muniz – Eu sempre fui uma leitora de livros de ficção, suspense, terror e literatura fantástica. Desde criança eu assisto ou leio narrativas de terror, e em muitas delas há mulheres que são vítimas e em outras envolvidas como bruxas. Eu também conto histórias para crianças e durante essas contações as bruxas fazem muito sucesso.  Durante a minha infância e depois na vida de professora e leitora, eu percebi que determinadas figuras femininas causavam um alvoroço, uma polêmica ou interesse. Eu fui lendo muitas coisas sobre isso. Eu escrevi livros infantis que tem bruxas e todos eles tem sempre uma pegada feminina. Tem o “Rita Não Grita”, que parece uma inversão do feminismo, mas não é. Ou esses livros possuem uma personagem feminina forte, que são irmãs mais velhas ou são garotas mais velhas que resolvem as coisas na turma. Eu tinha essa pegada e nem havia percebido, eu pagava um pau para uma menina, no sentido de dar voz para elas nas histórias.

Eu também escrevi o livro “Presente de Bruxa”. Eu fui levar um projeto para uma editora, que é essa do Sesi, que era para recontar histórias clássicas sob um novo protagonismo. Seria contar em versos, trazendo um pouco de informações sobre o autor, sobre porque conhecemos a essa versão da história. O editor felizmente recusou o projeto e quando eu estava saindo da sala, ele disse: “Flávia você escreve para jovens, não escreve? Por que você não aproveita essa ideia para um leitor mais velho?”. Então esse convite abençoado do Rodrigo, meu editor do Sesi, começou a funcionar como uma motivação. Eu abandonei essa história para os mais jovens e comecei a procurar a história que era significativa para mim. Se você for ver em outras histórias, as meninas são princesas que ficam chorando, ou foram amaldiçoadas e blá blá blá. Eu nunca me interessei por essa versão, porque não era essa história que eu queria contar, que me deixe insatisfeita.

Eu descobri isso na “Chapeuzinho vermelho”, que foi interpretada de diversas maneiras e em vária versões. Há essa dualidade do lobo representando o masculino, a mulher representando a coitadinha e o feminino. Eu comecei a debruçar sobre isso e cheguei a conclusão que eu tinha perguntas sobre essa história que não eram respondidas. Uma das versões mais famosas, traduzidas pela Tatiana Belinky, tem quatro páginas e conta exatamente com variações de dois pesquisadores. Em uma delas o lenhador mata o Lobo e o joga no rio, e outra mais sangrenta que o Lobo come a vovó e a Chapeuzinho. Outras pessoas escreveram outras versões dessa história, mas sempre com essa conotação sexual, da menina que é seduzida a seguir pelo caminho errado. E a pergunta principal era “Por que raios essa menina usa essa capa vermelha para andar na floresta?”.

Eu peguei todas essas pergunta que eu me fiz e não ficava satisfeita e delineei algumas respostas. O livro nasceu da visão de como eu contaria essa história, como pesquisadora que estivesse recolhendo o contar folclórico da época. Eu compartilho esse ponto de vista com os leitores e quem conta a história é uma bruxa. Seria o olhar da mulher contando a história que você pensa que conhece desde pequeno. Depois que você ler a minha versão, talvez amplie a sua imaginação e fantasia. Eu escrevo uma narrativa sobre gerações de bruxas que tem poderes. A luta delas não é só contra os homens, é contra os sentimentos que as unem quando divergem nas ideias femininas. Esse livro foi uma surpresa para mim, porque ele é o resultado de uma elaboração que vem sendo feita mais o convite do Rodrigo que resultou na história desse tamanho.

A primeira parte conta tudo que ocorreu antes e a segunda parte que conta a vida da “Chapéu”, que é a protagonista. Eu escrevo ouvindo música e escolhi alguma especiais para o livro, onde existe um QR code que o leitor pode se conectar a uma playlist de ambientação no Spotify. Essas músicas estão entrelaçadas com a história. Existem artes que foram pinçadas do pinterest. Eu dou muito valor para o áudio e para o visual. A Chapeuzinho ficou em terceiro plano, porque a história das bruxas tomou conta da narrativa. Eu estou muito inseguro com o resultado, as pessoas dizem que gostam, mas eu gostaria muito de ouvir o leitor que é novo.

Isso será uma coleção e eu pretendo chamar escritoras para continuar a coleção, eu serei dona desse universo, então terei minha porcentagem e gestão das histórias. Vou chamar mulheres fortes e representativas para dar continuidade. O segundo se chamará “Casa na Floresta” e quem vai fazer sou eu, porque ele começa com uma personagem que sobra nessa história. Ela terá uma narrativa própria, mas no mesmo condado e na mesma aldeia.

Shirey Souza – A ideia do Alek Ciaran e Os Guardiões da Escuridão veio de um sonho que eu tive. Eu sonhei com o primeiro capítulo do livro, aí eu sentei e escrevi. Vira e mexe eu faço isso, principalmente com pesadelos, eles acabam virando contos de terror. Esse sonho foi muito forte, aí eu sentei e escrevi, e não sabia o que fazer com aquilo. Eu falei “isso não é um conto”, o primeiro capítulo acabava de um jeito que eu nem sabia quem era o personagem, mas era muito forte. Eu guardei aquilo, aí depois de uns meses eu tive outro sonho que parecia continuação daquele. Daí eu fui lá, escrevi e disse “Opa, daí rola história”. Foi aí que começou a acontecer a história, de quem era o Alek e o que iria acontecer com ele.

A coisa começou a se delinear dessa forma. Ao longo do livro foram vários sonhos que davam vários momentos. Quando eu não sabia o que fazer, eu jogava videogame e ia dormir, que resolvia. O meu subconsciente trabalha de uma forma “uau”, sozinha eu não teria conseguido pensar nisso. O processo aconteceu aos poucos, então ele foi pensado e repensado muitas vezes. Foi um projeto longo, eu demorei cinco anos para concluir. Esse é o primeiro de uma trilogia, então eu já sabia o que era o segundo e o terceiro. Eu já estou escrevendo o segundo, já está bem adiantado.

A história do Alek é que ele é um garoto de 15 anos, que ao contrário de várias aventuras fantásticas onde o protagonista tem uma vida “ferrada” aqui e quando vai para o universo fantástico fica tudo ótimo, o Alek tem uma vida super legal. Ele ama o cotidiano dele, é um garoto tímido que não costuma ficar se expondo, mas tem relações bem construídas. Não é ligado ao universo fantástico, em games, o melhor amigo dele, Lucas, que é conectado em tudo. Eles se identificam por outros aspectos, nesse aspecto eles não tem nada a ver. O Lucas larga tudo para poder jogar. Em determinado momento eu fiz com o Alek o que acontece comigo, ele tem um pesadelo. Isso marca ele de maneira tão forte que ele fica chocado. Isso mexe mais ainda com ele quando ele chega na sala de aula e encontra a menina do pesadelo dele, que aparece como uma aluna nova. A partir daí, ele começa a questionar o que é real e o que é fantasia. Ele vai descobrir que aquilo que existe nos games e nos livros é de verdade. O Alek descobre que algumas pessoas acessam esse mundo através dos sonhos e algumas conseguem atravessar para esse universo.

Esse universo é mais antigo que o nosso e já tiveram várias organizações ao longo do tempo, que atualmente se dividiram em duas grandes forças. Temos a Luz e a Escuridão, dentro dessas forças podem existir o bem e o mal. O vampiro, por exemplo, é um ser da escuridão, podendo ser bom ou mau. O Alek descobre que ele é o filho proibido da luz e da escuridão, que teve de ser escondido aqui durante um tempo. Conforme ele avança nesse universo, ele descobre que os dois líderes, o da Escuridão e o da Luz, encaram o Alek como um arma em potencial. Sendo filho dos dois lados, ele pode dominar os dois e subjugar um deles. Os dois vão disputando o Alek e o leitor acompanha a descoberta dele no que de fato ele é. Para ele não é tão mágico sair do seu mundo confortável e ir para essa.

Tem duas meninas que o acompanham, a guardiã da escuridão, que é totalmente louca, a Garibe. Eu tenho uma grande dificuldade de estruturar os personagens enquanto eu escrevo, demoro um tempo pensando no que ele gosta de ler, jogar, comer ou escutar. Eu tinha uma cena que estava pronta e a Garibe veio pronta, até com nome, que é outra coisa que demoro para escolher. Todo mundo que leu o livro, se apaixona pela Garibe. Do lado da Luz tem a Abhaya, que é uma guerreira. Enquanto a Garibe é uma guardiã que só luta quando necessário, com as artes de metamorfa dela, a Abhaya quer a luta. Ambas sabem muito bem o que elas são e querem, enquanto o Alek não. Elas não tentam influenciá-lo, apenas com que ele se decida e assuma uma posição. Em um primeiro momento, elas até tentam influenciá-lo. Porém, quando elas o conhecem, elas tentam fazê-lo perceber que nesse mundo você tem que ser alguém.

Vale mencionar que, por mais estranho que pareça, o livro tem uma “cena pós créditos”.

Otto

Um rapaz que fez do hobby um trabalho. Sempre interessado em aprender e conhecer mais. Gamer desde criança e aficionado por Board games. Altas madrugadas jogando e trabalhando incansavelmente.