Return to Monkey Island – Review

Return to Monkey Island é o retorno glorioso que a série merecia

Pode ser difícil de acreditar, mas, no começo dos anos 1990, a LucasArts era uma das principais desenvolvedoras de jogos originais do mercado. Ao mesmo tempo em que ela tinha acesso a propriedades como Indiana Jones e Star Wars (e as usou muito bem), a empresa também apostava em diversos roteiros originais marcados pela inteligência e pelo bom humor — e foi assim que nasceu Monkey Island.

Fruto de uma forte parceria entre o diretor Ron Gilbert e o designer Dave Grosmann, o game apresentou ao mundo uma história de pirataria protagonizada por Guybrush Threepwood. Mas esse não era um herói convencional: tão sortudo quanto desastrado, ele usava métodos inusitados para derrotar o pirata-zumbi LeChuck e conquistar o coração da aventureira Elaine.

Enquanto Gilbert e Grossman voltaram a repetir a parceira no segundo game da série, eles acabaram se afastando dela e da LucasArts nos anos seguintes — e a franquia acabou continuando pelas mãos de outros escritores, cada um com ideias e histórias próprias para contar. Mais de 20 anos depois, os dois criadores voltaram a se unir para entregar ao público Return to Monkey Island, game que traz diversas camadas interpretativas e uma nova aventura repleta de reviravoltas.

Return to Monkey Island volta ao passado com espírito renovado

Desenvolvido pela Terrible Toybox, o novo game da série acontece logo após os acontecimentos de Monkey Island 2: LeChuck’s Revenge, mas não necessariamente ignora os capítulos que foram lançados mais recentemente. Enquanto o roteiro é quase um “remake” dos dois primeiros jogos em certo sentido, ele traz diversos personagens e referências a situações que não foram criados por Gilbert e Grossman.

Felizmente, isso não é um problema caso essa seja sua primeira experiência com a sequência. Além de conter um divertido álbum de recordações das aventuras anteriores de Guybrush (que traz uma surpresa tocante após os créditos rolarem), o título traz uma história nova que é muito fácil de acompanhar.

Return to Monkey Island

Após falhar em descobrir o Segredo da Ilha do Macaco, o protagonista está disposto a encontrá-lo a todo custo — mesmo sem fazer ideia de qual é seu objetivo, ou do motivo pelo qual ele decidiu seguir essa missão. No entanto, o pirata LeChuck tem a mesma missão e muito mais recursos a sua disposição, e cabe a você encontrar os meios de impedir que ele obtenha a vitória nessa competição.

Return to Monkey Island segue o espírito dos jogos do passado, mas traz uma série de mecânicas e recursos atualizados. Em vez de oferecer aos jogadores uma lista de verbos que servem como base para a interação com personagens e itens, o game simplifica as interações disponíveis ao oferecer sempre duas opções básicas, cada uma associada a um botão do mouse.

De forma semelhante, o game agora conta com uma lista de tarefas — que evita que você se perca cabo não saiba o que deve fazer —, um sistema de dicas opcional e um sistema de puzzles muito mais lógico do que no passado. Nele se tornou muito mais difícil se perder ou ficar preso em alguma parte do mapa, ao mesmo tempo em que é mantido um bom nível de desafio que se amplia nas partes mais avançadas da aventura.

Return to Monkey Island

As mudanças de direcionamento são bastante positivas, dando um bom ritmo ao game e fazendo dele acessível, mas não excessivamente fácil. Minha única crítica é o fato de que, com a eliminação do sistema de verbos, perdem-se algumas das interações e falas inusitadas que eram comuns em capítulos anteriores.

No entanto, isso não elimina totalmente o caráter experimental de Return of the Monkey Island: enquanto os verbos são simplificados, ainda há uma gama grande de itens cujos efeitos podem ser testados de maneira variada. De forma semelhante, o game mantém um sistema de diálogos ricos, em que escolher as opções que não progridem o roteiro rendem recompensas na forma de diálogos surreais e bastante engraçados.

Return to Monkey Island é um game engraçado de forma sincera

A maior força do novo game da Terrible Toybox não reside em suas mecânicas, mas sim em seus roteiros. Gilbert e Grossman se mostram tão afiados quanto há 20 anos, criando uma linha narrativa inteligente e diálogos que conseguem ser ao mesmo tempo engraçados, intrigantes, surreais e tocantes — muitas vezes variando entre todos esses tons dentro da mesma interação, sem que isso gere estranhamento.

Return to Monkey Island

Desde o começo, o jogo estabelece que Guybrush Threepwood oferece a combinação perigosa de um pirata que não tem muito talento ou sutileza, mas não tem a mínima ideia de suas limitações. Somado ao fato de que ele é extremamente determinado, isso faz dele uma verdadeira força de destruição que deixa um rastro de caos em seu caminho.

Enquanto um jogo escrito de forma menos talentosa faria dele um personagem intragável, e suas ações seriam representadas de maneira trágica, isso não acontece em Return to Monkey Island. Por mais chocante que seja a passagem do personagem por uma floresta repleta de criaturas mágicas, por exemplo, é difícil não se pegar rindo do que acontece por lá — especialmente porque Threepwood não faz ideia do prejuízo que causou.

Return to Monkey Island

Ajuda muito nisso o fato de que o personagem volta a ser dublado por Dominic Armato, que desde o lançamento de Curse of Monkey Island (1997) entrega uma das interpretações mais icônicas de toda a indústria de games. Seu Guybrush é ao mesmo tempo aventureiro, ignorante, curioso, desinteressado, sagaz e estúpido, em uma mistura que faz dele adorável, por mais que suas ações sejam recrimináveis.

É complicado não ser exagerado ao elogiar as qualidades do roteiro de Return to Monkey Island, especialmente pelo fato de que até hoje são raros os games que entendem tão bem como explorar esse quesito. A história tem momentos de autorreferência, comentários simplesmente bobos, sarcasmo (sem nunca cair no simples niilismo) e pura diversão, que fazem com que cada momento da aventura seja um novo prazer a ser descoberto.

Return to Monkey Island é uma visita audaciosa ao passado

Return to Monkey Island é uma história sobre o retorno a um passado considerado glorioso, mas que pode ser um tanto diferente quando o revisitamos além dos limites da memória. E essa frase pode se referir tanto à nova aventura de Guybrush quanto ao game em si, que é muito consciente do que está tentando fazer — e não se deixa intimidar por quão difícil essa tarefa pode parecer.

Return to Monkey Island

Até mesmo a escolha por um estilo visual inusitado parece fazer parte dessa intenção (não se engane: o game é lindo, especialmente quando o vemos em movimento). Mais do que velhos desenvolvedores provando que ainda têm o que é preciso para desenvolver um ótimo game, o jogo prova que Monkey Island ainda pode ser uma série relevante e de vanguarda, por mais que o tempo tenha sido cruel para o mundo dos adventures.

Return to Monkey Island tinha tudo para não dar certo, mas funciona de forma surpreendentemente positiva e mostra que a parceria entre Gilbert e Grossman funciona tão bem (se não de forma ainda melhor) agora do que no passado. Com um final que deve se provar bastante polêmico, o jogo é um prato-cheio para fãs de longa data e para quem já conhecia a série, mas nunca teve a oportunidade de conferi-la anteriormente.

Return to Monkey Island foi lançado no dia 19 de setembro de 2022 para PC e Nintendo Switch. A versão analisada foi a de PC a partir de um código cedido pela Devolver Digital.

Nota: 8 de 10 minutos que eu consigo ficar sem respirar