Review – Marvel’s Avengers

Marvel’s Avengers traz desafios muito além dos poderes dos maiores heróis da terra

Marvel’s Avengers me traz lembranças claras da época em que o PlayStation 3 e o Xbox 360 eram os principais consoles do mercado. Na tentativa de assegurar que o público não iria revender títulos recém-comprados, produtoras passaram a adicionar elementos multiplayer mesmo em contextos no qual isso não fazia muito sentido.

Uma das vítimas disso foi a própria Crystal Dynamics, que introduziu sistemas cooperativos em Rise of the Tomb Raider — e não julgo ninguém que se esqueça de que isso existiu. Enquanto na prática o sistema em si não era ruim, não era aquilo que atraia no game: a maioria das pessoas interessadas estava ali para ver a história single player, não participar de atividades online que nada tinham a ver com o DNA da série.

De certa forma, Marvel’s Avengers segue um caminho semelhante, mesmo que, desde o começo, tenha sido vendido como uma experiência cooperativa no modelo “jogos como serviço”. Enquanto a história principal é divertida e até inspirada em alguns momentos, parece que o componente multiplayer “sobra” e está ali mais para fazer gordura do que ser algo empolgante que é a peça central do game.

Mais do que a cena da ponte

A primeira reação ao começar o jogo foi a de que a Crystal Dynamics e a Square Enix erraram feio no material promocional. A tão conhecida “cena da ponte” está aqui, mas embalada com um contexto de história muito mais interessante e que, acertadamente, tem em Kamala Khan seu ponto central.

A atual Miss Marvel é um personagem recente dos quadrinhos que, como fã dos Vingadores, representa muito bem a visão que o jogador tem deles. A empolgação dela de estar ajudando os heróis de sua infância é contagiante, e rende várias interações muito divertidas com os demais personagens: a cena dela viajando com o Hulk (você vai entender quando ver) consegue ser genuinamente engraçada.

Conforme a trama vai avançando, somos apresentados — e controlamos — o resto dos membros da equipe, no que, na prática, é um “grande tutorial” de cada um. Felizmente, isso não é algo que fica tão na cara e não há aquela sensação de que estamos testemunhando só um “aquecimento” para o modo single player.

Embora eu tenha considerado que a trama ficou um pouco apressada nos trechos finais, ela é genuinamente divertida e traz boas cenas de ação — alguns takes parecem ter saído diretamente do universo cinematográfico da Marvel. Como esperado de um jogo como serviço, há brechas de sobra para novos acontecimentos e sequências, mas o arco principal tem uma boa conclusão e nos prepara bem para a parte multiplayer, que tem seus quinhões de problemas.

Recompensas que não valem o esforço

O segredo para um jogo como serviço dar certo não é exatamente sua jogabilidade, qualidade gráfica ou trama, mas sim se ele é divertido e recompensador — se outro desses elementos está presente, melhor ainda. No caso de Marvel’s Avengers, parece que é justamente esse o ingrediente que está faltando agora.

O sistema de combate é legal, e há certo prazer em evoluir os personagens, mesmo que a semelhança entre eles tenha um limite bem claro (consequência da decisão de ter que permitir que os jogadores joguem tudo sozinhos). No entanto, o mesmo não pode ser dito dos equipamentos: genéricos e sem impacto visual, eles na prática não passam de números associados a seu personagem que não parecem fazer tanta diferença assim na maneira como você joga.

Também não ajuda que a estrutura das missões, em geral, é bem pouco inspirada. Vá até o ponto A, mate alguns inimigos, chegue ao ponto B e o proteja, entre no elevador para matar mais alguns inimigos e abra um baú com recompensas — essa estrutura define 80% das missões encontradas que, para piorar, repetem sempre os mesmos assets, dando a impressão de que boa parte delas foi criada na base do “ctrl+C, ctrl+V”.

Problemas além dos maiores super-heróis do mundo

Falando dos problemas, não dá para ignorar as questões técnicas que permeiam Marvel’s Avengers. Desde a skin promocional do Capitão América que distorce seu rosto até os bugs que impedem que missões sejam finalizadas, Marvel’s Avengers é um jogo que vai além do pouco polido: parece que tem coisa aqui que simplesmente pulou algumas etapas de produção.

Joguei tanto no PS4 Pro quanto no PC, e em ambas as plataformas ficam evidentes as quedas de desempenho em momentos em que há uma boa quantidade de inimigos na tela. Mesmo usando um Core i9 9900K combinado a uma RTX 2080, 32 GB de RAM e com o jogo instalado em um Samsung EVO 960, houve momentos em que o framerate desabou para menos de 12 fps — isso jogando em 1080p. As coisas foram ainda piores em minha tentativa de jogar em 1440p, já que o game não escala nada bem a quantidade de recursos que usa.

Seguindo o bonde de reclamações, também preciso criticar a interface de Marvel’s Avengers que é tudo, menos intuitiva. O jogo torna mais confuso do que o necessário voltar para a base, pegar missões de facção ou se juntar a missões multiplayer criadas por outra pessoa — algo que deveria estar na tela de pause acaba sendo escondido sobre duas camadas da tela de seleção de missões, por exemplo. Depois que você entende as coisas até que funcionam bem, mas parece que quem criou o sistema não estava acostumado com a maneira como jogadores interagem com títulos multiplayer.

Um bom jogo para podcasts

Embora eu tenha reclamado bastante de Marvel’s Avengers, eu já passei mais tempo do que esperava com ele — e devo voltar pelo menos para maximizar o nível de equipamento do Capitão América. O game tem uma campanha legal e, mesmo que o lado multiplayer não seja o mais inspirado, ainda é bem legal jogar com os amigos e ver os números subindo na tela — mesmo que a repetição impere em questão de pouco tempo.

Na prática, o jogo — assim como boa parte do mercado “jogo como serviço” — é uma boa companhia para ouvir podcasts ou ver vídeos do YouTube numa tela secundária. Sabe aquele tipo de game que não importa tanto a história e o lado mecânico é “automático” o bastante para não demandar tanto atenção? Então, o título da Crystal Dynamics é bem assim.

É difícil prever qual vai ser a longevidade do game, que tem na chegada de novos heróis e histórias seu lado mais atraente. Caso a desenvolvedora consiga aliar isso a uma melhor estabilidade de desempenho e a recompensas de gameplay mais robustas, até dá para ver ele durando alguns anos com uma boa fase de fãs. Caso contrário, sinto que ele está condenado a ser um daqueles jogos que é deixado de lado por boa parte dos jogadores assim que a campanha chegar ao fim.

Nota: 7/10 pela campanha, e quase não passa de ano pelos problemas técnicos

Texto por Felipe Gugelmin