Crítica – Vidro
Shayamalan faz filme confuso, mas que deve agradar fã
Após a bem sucedida experiência da Marvel, os universos cinematográficos se tornaram uma certa obsessão de Hollywood. Procura-se aglomerar o maior número de franquias possíveis, muitas vezes perdendo a qualidade no caminho. Assim, quando em 2016, na última cena de Fragmentado, foi revelado que o filme era uma sequência para um dos primeiros filmes de super herói da década de 2000, Corpo Fechado, as expectativas se tornaram imensas.
Vidro, sequência para esses dois filmes, conta o embate entre o justiceiro David Dunn (Bruce Willis) e Kevin Wendell Crumb(James McAvoy), um assassino em série com 24 personalidades. Os dois personagens, já estabelecidos nos filmes anteriores, são postos a prova pelos planos do Senhor Vidro (Samuel L. Jackson), outro personagem recorrente. Em meio a tudo isso, a psiquiatra Ellie Staple (Sarah Paulson) tenta provar que os três indivíduos não tem super poderes.
Em Vidro, o diretor M. Night Shayamalan se propõe mais uma vez a discutir a questão “E se os super heróis fossem reais?”. Entretanto, ao longo do filme, Shayamalan habilmente introduz a dúvida de se o que vemos na tela são seres superpoderosos, ou apenas indivíduos com delírio de grandeza. Ao trabalhar essa questão, o cineasta é capaz de criar incerteza até no mais devoto fã de sua trilogia, fazendo-nos questionar tudo o que foi visto nos filmes anteriores. É uma pena que o diretor jogue todo o suspense criado nos primeiros dois atos para construir um terceiro ato confuso, que parece mais querer surpreender o espectador do que de fato contar uma história. Há boas ideias no final do filme que acabam sucubinando nas inúmeras outras reviravoltas que nada acrescentam a trama.
Além do final confuso, outro fato que prejudica a compreensão do longa é o quanto ele se apega aos seus predecessores, considerando que o primeiro filme da trilogia saiu há mais de 18 anos. Alguém que não tem familiaridade com o universo criado pelo cineasta encontrará certa dificuldade para entender o que se está passando, visto que a todo momento, o filme faz referências a acontecimentos anteriores e não se importa em explicar isso para novatos.
Algumas frases pontuais recordam a audiência de quem é cada personagem, mas no geral, espera-se que quem esteja assistindo já os conheça. O personagem de Willis, assim como em Corpo Fechado, se mantém a parte mais chata de toda trilogia. Raso, Dunn só serve para levar a história de ponto A ao ponto B, sem jamais cativar o público no caminho. James McAvoy rouba a cena novamente, interpretando de maneira brilhante as já conhecidas personalidades de Fragmentado. Algumas personalidades que não foram apresentadas no filme anterior aparecem no novo longa, mas elas pouco tempo de tela tem e quase não se destacam. Samuel L. Jackson como Senhor Vidro mantém sua atuação caricata do vilão, tendo ótimos momentos, assim como outros péssimos por conta de um roteiro piegas.
A todo momento, as convenções de quadrinho são debatidas, quase sempre em forma de monólogos do Sr. Vidro. E se isso pode extasiar os fãs da mídia, em certo ponto acaba cansando e se tornando risível. No clímax do filme, diversas são às vezes que referências a quadrinho são ditas de forma quase irresponsável, quebrando toda a imersão e arrancando risadas de vergonha.
Shayamalan parece não se decidir se quer fazer um estudo do tão popular gênero de super heróis, um filme sombrio sobre vigilantes, ou um suspense sobre a loucura de seus personagens. O diretor acaba por entregar um híbrido, que funciona muito bem em determinados aspectos, mas acaba se engolindo na quantidade absurda de informação que carrega. Some isso a uma relação problemática entre a personagem de Anya Taylor-Joy com Kevin Wendell Crumb mais um terceiro ato cheio de reviravoltas que ocorrem de maneira muito rápida e Vidro acaba decepcionando pelo tamanho potencial que tinha. Ao fim da história, fica a impressão de que o confronto final entre esses três personagens poderia ter tido um desfecho muito mais satisfatório.
Texto por Daniel Vila Nova