Review – Fatal Fury: City of the Wolves
Após um hiato de 25 anos desde o cultuado Fatal Fury: Mark of the Wolves, a lendária série da SNK finalmente retorna com Fatal Fury: City of the Wolves. A expectativa dos fãs era grande, dada a aura quase mítica que o último título conquistou entre os fãs veteranos, frequentemente colocado ao lado de gigantes como Street Fighter III: 3rd Strike e Marvel vs. Capcom 2 pela sua velocidade e estilo.
O resultado é um jogo de luta que oferece um combate eletrizante e profundamente recompensador. Contudo, sua jornada de retorno é marcada não apenas por falhas técnicas e de conteúdo, mas por uma questão ética de grande magnitude que paira sobre toda a experiência.
Dinamismo e profundidade
O triunfo indiscutível de Fatal Fury: City of the Wolves reside no seu sistema de combate. Os confrontos são rápidos, impactantes e encontram um equilíbrio admirável entre a tradição tática de jogos como Street Fighter e a agressividade fluida dos conhecidos como anime fighter. A base de quatro botões (dois para socos, dois para chutes) simplifica o ponto de entrada sem sacrificar a profundidade estratégica, mantendo o padrão conhecido por muitos.
O jogo brilha nas batalhas de espaçamento (ou footsies), favorecendo punições precisas e jogo de “poke” graças ao bom alcance dos ataques básicos e à ausência de um movimento universal de aproximação rápida (como o Drive Rush do SF6). Isso cria uma dança mental constante pelo posicionamento ideal. Acredite, um erro pode definir a partida como um todo.
A mobilidade e a hora certa de apertar botão são cruciais. A velocidade horizontal ágil e a variedade de saltos (padrão, curto e de dash), cada um com trajetórias distintas, permitem abordagens aéreas versáteis. A possibilidade de bloquear no ar, similar ao “air parry” do Third Strike, adiciona uma camada de segurança e estratégia a esses movimentos, tornando os combates aéreos mais ricos e consideravelmente menos arriscados se você acertar o tempo da defesa no ar.
Porém, essa flexibilidade é contrabalançada pela mecânica de Breaking. Cancelar movimentos especiais a meio da execução, especialmente para interceptar oponentes no ar (como num “shoryuken” cancelado seguido de combos devastadores), é uma sensação visceralmente gratificante. Esta mecânica, aliada aos Feints (ou basicamente uma finta para tentar enganar o oponente), adiciona profundidade tática sem sobrecarregar o jogador.

O medidor REV
O sistema REV é outro pilar fundamental. Inspirado, mas invertendo a lógica de medidores tradicionais, ele começa vazio. O jogador pode usar técnicas especiais aprimoradas desde o início, mas com o risco de “Superaquecimento” se abusar delas.
Superaquecido, fica impedido de usar movimentos REV e vulnerável a quebra de guarda. Essa tensão constante entre aproveitar o poder imediato e evitar a penalização severa cria uma ótima dinâmica estratégica.
Movimentos REV podem ser cancelados entre si, permitindo pressão criativa e combos com um feeling mais livre e expressivo. A defesa também é robusta: gastar REV para repelir o oponente durante a guarda ou executar Just Defends (bloqueios perfeitos que levam a contra-ataques) permite viradas espetaculares baseadas na leitura do adversário, promovendo interatividade constante. O elenco, com estilos únicos, completa essa base sólida e envolvente.
Desequilíbrios e conteúdo limitado
Os REV Blows emergem como um ponto de atrito significativo. Estes golpes blindados (semelhante ao Drive Impact de SF6), que ignoram ataques e não são puníveis quando bloqueados, podem dominar o jogo durante o terço específico da barra de vida em que estão ativos.
Apesar de contramedidas existirem (usar um REV Blow próprio – exigindo estar no limiar de vida correto –, Supers ou agarrões), sua eficácia limitada e a necessidade de condições específicas simplificam dramaticamente o jogo nesses momentos, focando excessivamente nesta única mecânica. Enquanto jogadores experientes podem desenvolver estratégias, em níveis mais casuais permanecem uma fonte de frustração.
Fora do combate principal, o jogo se revela modesto. O modo Arcade segue o padrão básico dos jogos de luta, no qual oferece histórias curtas mas substanciais para os personagens. Já o modo Episódios de South Town, é um pseudo-RPG onde se enfrentam capangas e se desbloqueiam habilidades passivas, é uma experiência limitada e repetitiva, apesar de apresentar alguns momentos narrativos divertidos. Funciona como um passatempo curto que pode ser útil para aprender o boneco em questão, mas está longe de ser um motivo para adquirir o jogo para quem busca apenas conteúdo solo.

A experiência online apresenta luz e sombra. O netcode rollback e o cross-play (entre PS4, PS5, PC e Xbox Series X/S) funcionam bem contra oponentes com ping estável, facilitando o encontro de partidas.
No entanto, Fatal Fury: City of the Wolves carece de refinamentos básicos esperados hoje. Não é possível verificar a conexão (cabo ou Wi-Fi) do oponente antes da luta, um detalhe crucial para a estabilidade. Outras lacunas incluem a ausência de rankings separados por personagem (jogar com um novo lutador pode prejudicar sua classificação principal), um sistema de lobby pouco intuitivo e menus pouco atraentes e difíceis de navegar. Entre todos os títulos de luta lançados nos últimos anos, a SNK deixou muito a desejar nos quesitos UI e UX do jogo.
Além disso, o modo Treino é demasiado básico, dificultando a prática de situações específicas, e o Tutorial é insuficiente, criando uma barreira para novatos.
Outro elemento no qual parece que não foi muito bem pensado é a diferença entre os modos Arcade (tradicional para jogadores experientes) e o modo Simplificado, semelhante aos modos Clássico e Moderno de Street Fighter 6. Entretanto, diferente de SF6, o modo simples de City of the Wolves peca na ausência de mecânicas essenciais para uma partida, o Break e o Feint mencionados anteriormente, tornando o seu leque de abordagens mais limitado, impossibilitando de se tornar viável competitivamente ou até mesmo para um “5 minutos sem perder amizade” com alguém mais experiente no jogo.
Ética e influência externa
Todas essas falhas técnicas, porém, podem ser secundárias para muitos devido à qualidade do combate. Contudo, uma questão muito mais complexa e pesada define a recepção deste jogo: seu financiamento e influência. O Fundo de Investimento Público (PIF) da Arábia Saudita detém 96% da SNK. O governo saudita tem usado o PIF em operações de “sportswashing” – tentando lavar sua imagem internacional, manchada por graves violações de direitos humanos (como a opressão de cidadãos e assassinatos) – através do financiamento massivo de esportes e, agora, de videogames.
Esta ligação torna-se grotescamente explícita em City of the Wolves com as escolhas de personagens convidados: o astro do futebol Cristiano Ronaldo e o DJ Salvatore Ganacci.
Ambos possuem ligações diretas e lucrativas com o PIF (Ronaldo atua na liga saudita, Ganacci se apresentou no país), sendo essa a única lógica plausível para sua inclusão tão dissonante num universo de joguinho de luta.
Enquanto Ganacci passa como uma curiosidade forçada, a presença de Ronaldo é profundamente problemática. Além de seu modelo visual desajustado e de ocupar uma vaga que poderia ser de um personagem clássico, Ronaldo carrega a pesada acusação de agressão sexual num caso de 2009, envolvendo alegações de violação e pagamento para silenciar a suposta vítima, sendo até mesmo banido de pôr os pés em Las Vegas.
Embora o processo tenha sido arquivado por uma questão técnica (uso de documentos obtidos ilegalmente), as alegações e o contexto permanecem mal resolvidos. Sua inclusão, claramente influenciada pelo PIF, transforma o que deveria ser uma celebração nostálgica num constrangedor exercício de propaganda.

Fatal Fury: City of the Wolves rende ótimas brigas
Fatal Fury: City of the Wolves é, estritamente como experiência de combate, um excelente jogo de luta (no qual me faltam 30 anos de experiência para acompanhar outros jogadores da velha guarda). Vale destacar que pode ser um pouco estressante tentar iniciar sua jornada nesse jogo em específico.
Sua velocidade, os sistemas deveras simples e interconectados (Breaking, Feints, Just Defend, REV Gauge), e a agressividade tática oferecem uma jogabilidade fresca, recompensadora e cheia de nuances. É um digno sucessor espiritual de Garou em termos mecânicos, apesar dos problemas de menus, interface e do conteúdo solo limitado.
Contudo, a alegria desse renascimento é irremediavelmente ofuscada pelas falhas significativas na apresentação e nos recursos online e pelo financiamento saudita e das escolhas de personagens que a materializam dentro do jogo.
Fatal Fury: City of the Wolves: Fatal Fury: City of the Wolves é, estritamente como experiência de combate, um excelente jogo de luta. Vale destacar que pode ser um pouco estressante tentar iniciar sua jornada nesse jogo em específico, a falta de melhores ferramentas de treino e iniciação carecem na experiência – Otto