Crítica – Aquaman

James Wan mistura diversos gêneros e constrói filme abarrotado de informações,  mas extremamente divertido

Aquaman continua a história iniciada em Liga da Justiça (2017), nela, Arthur Curry, interpretado por Jason Momoa, é um filho bastardo da rainha de Atlântida com um mero mortal. O Aquaman, como é conhecido pelos mortais, recebe a visita de Mera (Amber Heard), filha de um dos rei dos mares. Ela pede sua ajuda para derrotar o príncipe Orm (Patrick Wilson), meio irmão de Arthur por parte de mãe, que planeja invadir a terra e dominar a humanidade. Os dois partem em uma jornada para destronar Orm e coroar Arthur como o rei legítimo de Atlântida.

O personagem Aquaman sempre foi motivo de chacota entre os aficcionados por super-heróis. Sempre ao lado de semi-deuses como Super Homem e Mulher Maravilha, Arthur Curry se tornava um alvo de piadas por ter, como seu principal poder, a habilidade de se comunicar com peixes. A DC, responsável pelo herói, vem repaginando o personagem há algum tempo, tornando-o mais descolado e mais poderoso, alguém digno de estar na Liga da Justiça. Assim, quando Jason Momoa, o Khal Drogo de Game Of Thrones, foi escalado para viver o rei de Atlântida, parecia que o filme seguiria o mesmo caminho de sua contraparte nos quadrinhos. Para a surpresa do público, James Wan, o diretor do filme, escolheu apostar na origem brega, e talvez até ridícula do super herói, fazendo um filme que lembra, em seu humor, uma aventura dos anos 80 de sessão da tarde. Wan vai na contramão do do universo estabelecido por Zack Snyder e assume para si o absurdo que são os filmes de herói, transformando a maior fraqueza de Aquaman em seu maior atributo.

O diretor, famoso pela criação das séries de terror Jogos Mortais e Invocação do Mal (e seus derivados) já havia se aventurado em outros projetos cinematográficos fora do terror, como no sétimo filme da franquia Velozes e Furiosos. Entretanto, é com Aquaman que ele prova ser um diretor capaz de fazer qualquer tipo de filme, transformando a breguice do gênero em artifício narrativo, utilizando frases de feitos melosas e piadas bestas para dar o tom do longa.

Ainda assim, atrás da simplicidade da história de origem de um super-herói, o cineasta cria uma rica mitologia do universo do personagem, se aventurando entre diversos gêneros cinematográficos no processo. O filme é extremamente didático, pegando o espectador pela mão e mastigando todas as informações para melhor digestão. O que poderia ser entendido como o filme subestimando a audiência é contornado pela quantidade de informação e ambientes que são apresentados ao longo das duas horas e meia de duração da película. Assim, a superexposição serve para garantir que o público esteja acompanhando a história do filme.

Os diversos ambientes, inclusive, são uma das melhores partes do filme. O trabalho de efeitos visuais junto com a direção de arte dão personalidade e força aos seres mitológicos do filme, ajudando a caracterizar cada local e conferindo particularidade a todos os lugares. O design de produção é umas das principais armas de Wan ao se aventurar pelos vários tipos de cinema que se propõe a fazer. O reino de Atlântida parece ter sido extraído do mundo de Star Trek, sendo uma autêntica ficção científica com suas armaduras e suas naves. Já a parte mundana do filme, se assemelha as aventuras de Indiana Jones por templos perdidos e cidades históricas. O reino do Fosso é ambientando como se fosse uma terra maldita retirada da mente do escritor H.P. Lovecraft (não à toa, um de seus mais famosos contos aparece logo em uma das primeiras cenas do filme, como um easter egg). Ainda existem ambientes que lembram o romance de Júlio Verne, em Viagens ao Centro da Terra. Com tanta bagagem e referências, o filme acaba pecando e se tornando um pouco confuso em alguns momentos. Há tramas e subtramas completamente desperdiçadas e que não tem motivo para existir no filme, só ocupam tempo de tela. Um desses casos é o clássico vilão Arraia Negra, interpretado por Yahya Abdul-Mateen II. Vemos a origem do personagem, mas em nenhum momento ele parece ser o foco do filme, sua trama parece paralela aos eventos que ocorrem durante o longa e ao avistá-lo em cena, admito que sempre me surpreendia, pois constantemente esquecia que ele era parte daquela história.

Apesar dos excessos, James Wan consegue produzir as melhores cenas de ações do universo DC (rivalizando com as excelentes cenas de combate do Batman, em Batman vs Superman), o diretor abusa de planos longos e transições com efeitos especiais, além de ângulo arriscados, que conferem uma vivacidade as batalhas poucas vezes vistas no cinema de herói. E é refrescante para os olhos ver que Wan é capaz de imprimir sua assinatura original em um gênero reconhecidamente genérico e cíclico como o de super heróis.

Por fim, as atuações são a parte mais fraca do filme. Em sua maioria, elas parecem extremamente simplista. Não ajuda o fato do roteiro pouco se preocupar com as motivações dos personagens, distorcendo-as ao seu bel prazer quando conveniente para a história. O filme se preocupa muito mais com seu universo do que com seus personagens. Momoa consegue ser funcional como alívio cômico, mas é calado, fazendo pose de mau, onde mais se destaca. O par romântico de Momoa, Amber Heard, propõe uma atuação com pouca inspiração, mas que é capaz de convencer. Entretanto, assusta a falta de química que o casal principal tem, o que rende os piores momentos do filme. O único destaque positivo se encontra em Patrick Wilson, capaz de criar um vilão odiável, mas com um discurso compreensível.

Ao se focar na mitologia, admitir a cafonice do gênero e do personagem e imprimir seu estilo de direção, James Wan cria o melhor filme do universo DC, exatamente por não seguir os conceitos desse próprio universo. Mesmo com suas falhas, Aquaman ainda é um filme extremamente divertido, belo e empolgante.  

Texto por Daniel Vila Nova

Daniel Vila Nova

Fã de literatura, vai de Machado de Assis a Turma da Mônica em uma única sentença. Jogador de RPG, tem todos os consoles da Sony mas jura que não é Sonysta. Adora filmes ruins.